A prática da violência não é monopólio dos homens, pode ser praticado também por mulheres quando estas detém os meios e controlam o contexto para tal. O que observa, porém, nos últimos milênios, é o monopólio da violência por parte dos homens, tendo como alvo não apenas mulheres de seus próprios povos, como também, outros povos e territórios. E também homens de seus próprios povos – quando de religiões, etnias, orientação sexual, etc, consideradas inferiores por aqueles que detém o poder em dado momento histórico. Em geral essas violências ocorrem mediadas pelo poder econômico: quem controla meios de produção, vias de trânsito comercial, pontos territoriais estratégicos, etc, se percebe no direito de dominar populações.
No exercício da violência se dá um vale tudo dentro das possibilidades de ação que cada contexto promove. Em uma família com pessoas abusivas, vale quebra de acordos, isolamento social da vítima e abuso psicológico cotidiano. A pessoa abusiva vai testando até onde pode ir sem que perca legitimidade dentro do seu círculo de apoio, alargando o limite da sua violência aos poucos, na medida em que naturaliza a situação de abuso.
Em um democracia representativa em um país resultado de escravização, de usurpação do estado (patrimonialismo), fusão entre mandonismo local e representação estatal (coronelismo), ditaduras, genocídio de populações originárias, concentração de terras e naturalização das desigualdades sociais, etc, etc, também não há limites para a violência contra a população por parte de poderes representativos. Voltar a alargar as populações que passam fome, que não tem emprego ou moradia digna é apenas voltar à um estado anteriormente naturalizado, alargar novamente os limites da violência.
Em uma guerra, chefes de Estado testam também os limites de acordo com sua capacidade de destruição dentro da correlação de forças dadas. Estar em guerra é testar todos os limites não de forma paulatina, como nos exemplos anteriores, mas, de forma drástica e repentina. Países que antes cooperavam e que são pilares importantes de uma estrutura mundial de dependência mútua, começam a testar os limites de sua própria força. De um lado, se para de comprar petróleo do outro país, colocando uma população inteira em risco econômico. De outro, se ameaça a maior usina nuclear do continente, colocando milhões de pessoas em risco. No meio do caminho, cidades são destruídas, pessoas mortas, exiladas. A lógica da violência parte do pressuposto de que não há limites e é sempre possível violentar mais, na medida do poder de quem violenta, da aceitação de determinada violência como natural e de como a correlação de forças pende a favor deste ou daquele agente. Violência sempre foi estratégia. Tem faltado estratégias de não-violência em maior número. Estratégias tem que ser ser pensadas, propostas e colocadas em prática. Estamos falhando enquanto sociedade.
Daniela Alvares Beskow
12 de março de 2022
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