Esta coluna é direcionada para pessoas heterosexuais.
As relações sociais em todos os povos e países é pautada pela ideia e prática de que pessoas devem ser heterosexuais. Crianças são ensinadas desde cedo de que, quando adultas, elas devem ter como uma de suas prioridades, o casamento. E esse casamento é heterosexual. No Brasil, adultos estimulam essa ideia até mesmo em brincadeiras inadequadas para a idade, comentando, em relação à amiguinhas de meninos, “é a namoradinha dele”. Ou o oposto, com amiguinhos de meninas, dizem “é seu namoradinho”.
Abrindo um parênteses, pra início de conversa, não pensam o quão danoso é para a vida das crianças, brincadeiras de cunho sexual, ainda que disfarçadas de infância. Em um país com altos números de violência sexual de homens adultos contra meninas, pessoas adultas não deveriam estar incentivando crianças a estabelecerem relações de namoros com outras crianças. Crianças devem brincar e aprender sobre responsabilidades. Devem aprender também sobre o que é namoro e sexo, mas, como um tema do mundo dos adultos. É importante que aprendam sobre o que é violência, o que é aceitável no comportamento humano e o que não é. É importante que saibam sobre esses temas, inclusive, para identificarem situações de violência sexual vinda de adultos ou adolescentes. Fecha parênteses.
Voltando ao tema principal. A ideia sobre relacionamentos afetivos-sexuais a partir do parâmetro heterosexual é difundida em todas as áreas da sociedade. A doutrinação heterosexual começa cedo. Crianças crescem pensando que quando adultas, namorarão pessoas do sexo oposto. Não há outro panorama possível senão este, difundido pelo regime de violência denominado heterosexualidade. Este regime obriga pessoas a se encaixarem no padrão de sexualidade heterosexual e condena pessoas que não seguem esta norma. Pessoas homosexuais são rechaçadas e punidas, muitas vezes, com violências que lhes tiram a própria vida.
Lésbicas e gays percorrem um caminho difícil durante suas vidas. Violência psicológica, física, sexual, patrimonial, cometidas por pessoas heterosexuais que se acham no direito de violentar pessoas homosexuais, dentre outras razões, porque a sociedade legitima essas violências.
Algumas pessoas heterosexuais dizem com orgulho que tem amigos gays ou amigas lésbicas, ou que há gays e lésbicas no seu movimento social ou ambiente de trabalho. Muitas dessas pessoas, apenas toleram gays e lésbicas em seus espaços de convivência, mas, na primeira oportunidade, fazem um comentário pejorativo, deslegitimam suas falas, são indiferentes no ambiente social e em geral, simplesmente ignoram a existência dessas pessoas para além daquele espaço obrigatório de relação. Ignoram seus posicionamentos, não convidam para momentos de lazer, não estabelecem redes profissionais com essas pessoas. E seguem colaborando para o isolamento social de lésbicas e gays na sociedade.
Colabora para esse isolamento o próprio risco de vida que lésbicas e gays sofrem no cotidiano. Ao demonstrar afeto para com pessoas do mesmo sexo em espaços coletivos ou simplesmente por fugirem do padrão de corporalidade, estética e comportamento atribuído às pessoas – já que a heterosexualidade está ligada às noções de masculinidade e feminilidade que definem regras relativas à corporalidade, estética e comportamento – estão constantemente sob risco de violência física, sexual e psicológica nas ruas e muitas vezes dentro de suas próprias casas, em violências cometidas pela própria família ou vizinhos.
Você, pessoa, heterosexual, já parou pra pensar que o seu direito reconhecido de andar de mãos dadas nas ruas com seu cônjugue não é um direito de lésbicas e gays? Beijar seu cônjugue nas ruas, abraçá-lo, reservar um quarto de casal em uma pousada no interior, abraçar seu cônjugue na praia, no clube, na academia, ir em uma festa no final de semana a partir da possibilidade de um encontro afetivo-sexual com alguma pessoa do sexo oposto. Afinal, os códigos de paquera heterosexual nos espaços coletivos estão estabelecidos. Pessoas heterosexuais frequentam bares e festas também com o intuito de paquerar e namorar e tem ao seu dispor, todos os espaços da sociedade para fazê-lo, espaços que não questionam seu “direito” de paquerar e de expor beijos e abraços nesses espaços. Coisas tão banais que nem são questionadas. Pois é, apesar desse mundo cotidiano ocorrer na mais absoluta normalidade para pessoas heterosexuais, a situação é oposta para pessoas homosexuais.
Você já parou para pensar sobre isso?
Daniela Alvares Beskow
28 de fevereiro de 2020
Uma Coluna por Sexta
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